sábado, 2 de abril de 2016

Silêncio (Silencio)

https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Giovanni_da_san_giovanni,_la_quiete_che_pacifica_i_venti,_1632,_08.JPG#/media/File:Giovanni_da_san_giovanni,_la_quiete_che_pacifica_i_venti,_1632,_08.JPG


No interstício entre as palavras se encontra minha gênese. Eu nasci nas trevas dos significados, onde não se ilumina o que se quer dizer. Lá não há sons, apenas sombras destes que se fantasiam de forma e dependem da imaginação de quem está perto. São suspeitas de acepções, são esperas de vozes. Eu nasci por debaixo do manto das intenções.

Posso me vestir de alguns gestos, ou de olhares profundos que parecem vasculhar a alma, mas nada sou do que um reles intervalo que cimenta as ideias. Nada sou além do nada. Todavia, sou eu quem dita o ritmo dos sonhos e quem expressa o contentamento e a comoção apenas pela minha dimensão, pela chance que dou às lágrimas ou aos sorrisos. Posso ser pequeno, na medida do teu interesse, e posso ser grande ao envolver de horas a escuridão da tua razão. No desespero dos caminhos tortuosos da vida, que levam nossos destinos para horizontes imprecisos, posso ser teu companheiro. Quando olhares aquele sol despencando no firmamento, quando sentires a dor da solidão e quando deixares a vida para a eternidade, eu estarei lá contigo. Espera-me no tiquetaquear dos relógios e nas folhas que caem dos calendários e das árvores, outonos após outonos.

Hoje eu estou apenas escondido, entre uma palavra e outra. Tu apenas me supões na dinâmica da conversa. Mas eu crescerei e dominarei o relacionamento se as palavras que ligo não se traduzirem no teu coração.

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En el intersticio entre las palabras se encuentra mi génesis. Nací en las tiniebla de los significados, donde no se alumbra lo que se quiere decir. Allá no hay sonidos, apenas sombras de éstos que se fantasean de forma y dependen de la imaginación de quien esté cerca. Son sospechas de acepciones, son esperas de voces. Nací por debajo del manto de las intenciones.

Puedo me vestir de algunos ademanes, o de miradas profundas que parecen buscar el alma, pero nada soy de lo que un relees intervalo que cementa las ideas. Nada soy más allá del nada. Todavía, soy yo quien dicha el ritmo de los sueños y quien expresa el contentamiento y la conmoción apenas con mi dimensión, por la chance que doy a las lágrimas y a las sonrisas. Puedo ser pequeño, en la medida de tu interés, y puedo ser grande al envolver de horas la obscuridad de tu razón. En la desesperación de los caminos tortuosos de la vida, que llevan nuestros destinos para horizontes borrosos, puedo ser tu compañero. Cuando mirar aquel sol cayendo en el firmamento, cuando sentir el dolor de la soledad y cuando dejar la vida para la eternidad, estaré allá contigo. Me espera en la marcación de los relojes y en las hojas que se caen de los calendarios y de los árboles, otoños después de otoños.

Hoy yo estoy apenas escondido, entre una palabra y otra. Tú apenas me supones en la dinámica de la charla. Pero yo creceré y domeñaré la relación si las palabras que ligo no si traduzcan en tu corazón.

sábado, 27 de fevereiro de 2016

A Chuva e o Silêncio


A chuva bate no telhado. A aluvião de águas caminha, continua e desesperadamente, pelas frestas e canos até o seu destino no chão. Ora mais intensa, ora com a falsa calmaria da solidão. Rompe um silêncio, rompe o teu silêncio, que brotou de um passado contínuo e desesperado pelos sentimentos que, aluviais, caminhavam pelas brechas do teu corpo até seu destino na paixão.  Foste uma tempestade que terminou em tormenta. E agora, paira o silêncio do teu sorriso, da tua fragrância e de tantos sonhos fantasiados juntos. Um silêncio tão grande que torna irrelevantes estes trovões e esta chuva que cai com insistência.

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The rain hitting the roof. The water alluvium walks, continuously and desperately, through the slots and pipes to its destination on the ground. Sometimes more intense, sometimes with the false calm of solitude. Breaks a silence, breaks your silence, which sprouted from a past continuous and desperate by the feelings that flood and walked through the breaches of your body until its destination in the passion. You were a storm that ended in storm. And now, it hovers the silence of your smile, of your fragrance and of many dreams fantasized together. Such a silence that makes these thunders and rain, that falls insistently, irrelevant.

sábado, 20 de fevereiro de 2016

Velho

Por Attributed to or circle of Rembrandt - The Yorck Project: 10.000 Meisterwerke der Malerei. DVD-ROM, 2002. ISBN3936122202. Distributed by DIRECTMEDIA Publishing GmbH.Este ficheiro foi derivado deRembrandt Harmensz. van Rijn 106.jpg:, Domínio público, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=24475935

Cá estou na margem dos acontecimentos e posso eludir seus olhares com o vazio de palavras amenas, despidas de emoção. O tempo do amor está na tumba das minhas lembranças. O tempo dos rompantes nem chegou a existir. Apenas em alguns sonhos ou hesitações que me afastaram dos desejos juvenis. A idade sentencia meus anseios; agora fugazes, inoportunos e passados. O branco tinge minha cabeça, que pende para olhar o chão por onde passo. Não encara mais a condolência das pessoas, a gentileza protocolar e a imensa insignificância das suas expressões. Alguns amigos ainda estão por aqui, outros se foram por alguma estrada, outros por nenhum lugar.  Alguns se perderam, alguns se encontraram e eu sou convidado por sombras, nem tanto reais, a me findar. Névoas que agora espreitam uma jornada um pouco glamorosa, um pouco inútil. Eu me tornei velho e sábio e sei que nesta vida tudo vale um pouco para alguns e nada para a maioria. Destruímos mais do que construímos. Destituímos mais do que entregamos.  Mas vencemos. Chegamos nos derradeiros dias cansados, desiludidos, mas cientes de que cá estamos, onde tantos tombaram.

-x-

I'm here on the margin of happenings and I can elude your glances with the emptiness of mild words, devoid of emotion. The time of love is inside on the tomb of my memories. The time of the outbursts didn't even exist. Just in some dreams or hesitations that kept far from juvenile desires. The age sentences my desires; now fleeting, inopportune and passed. The white dye my head, that leans to look at the floor where I step. It does not more stares at the people's condolence, protocols of kindness and the vast insignificance of their expressions. Some friends are still here, others got out for some road, others for nowhere. Some got lost, some met their tracks, and I am invited by shadows, not quite real, to end myself. Mists that now lurk a journey a little glamorous, a bit pointless. I became old and wise and I know that in this life all worth a little for some people and nothing for the most. We have destroyed more than built. We have destroyed more than deliver. But we won. We arrived in the last days tired, disillusioned, but be aware that we are here, where so many perished.

sábado, 9 de janeiro de 2016

... E diz que me ama.

Por Carsten Tolkmit from Kiel, Germany (Kiel Bay at night) [CC BY-SA 2.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/2.0)], undefined


Com as primeiras brisas da noite, a impressão de quietude nos abraça. O sopro suave da Natureza mal agita as folhas da árvore acima, que balançam um balé soturno, manchadas pelas sombras da noite. A algazarra dos pássaros se calou. O ir e vir das conversas cessou.  O horizonte se apagou sob um manto negro. Nem uma voz de amantes ousa desafiar a solidão. Nem uma lágrima atreve-se a revelar a tristeza.

No silêncio dos teus olhos posso ouvir as tuas súplicas. Nos desenhos do teu rosto posso moldar a tua paixão. Você me cala na tua gênese para dizer que não há um passado, nem um futuro. Há aquele momento que se apartou da eternidade para contemplar a infinitude da condição humana. Apenas vã. Poucas vezes a vi assim, sem as cornucópias da ambição, sem as certezas das convicções. Desarmada de esperanças, desalmada de sonhos.

Na tristeza da tua face posso sentir o desespero da angústia. Na mudez é quando você mais grita e diz que me ama.

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

O Nada e o Mar

"Along the Coast-Alfred Bricher" by Alfred Thompson Bricher - artrenewal.org. Licensed under Public Domain via Wikimedia Commons - https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Along_the_Coast-Alfred_Bricher.jpg#/media/File:Along_the_Coast-Alfred_Bricher.jpg

O império do vazio! Não haverá subterfúgios para contemplarmos a infinitude do nada. O ser é provisório, o nada permanente. Caminho despejado dos meus pensamentos, desprovido de perguntas. É inverno e o vento lança as gotas eriçadas das cristas das ondas, que crepitam geladas na minha face. Chão úmido de sensação congelada, o mar me toca com braços amplos. Deseja-me. Abro os meus braços como prévia de amplexo para mergulhá-lo. Nego-o. Sigo meu caminho pela orla, mantendo-me no abissal desde a minha vontade e o mar. Somos apartados pelo destino. Não enfrento suas ondas e suas tempestades. Não marinho pelo seu corpo porque ela está em outro vazio. Ela? Um rosto? Não! Ela é o nada que nada pode, que nada navega, que nada sonha pelas tranças da maré que nunca a levou. Esqueço-a porque sua existência foi tão efêmera em mim, quanto este filhote de cão que agora me acompanha. Olhos grandes pedintes, mendicantes. Tenho certeza que são os meus olhos, os mesmos que lhe negam súplica. Mas ele ainda me segue, em direção ao nada que somos e seremos. Numa persistência que imita esta vida inútil. Quiçá me siga a sete palmos, quiçá no escritório teatral que protagonizo. O amplo mar e o mísero cachorro. Estou no meio disto para sempre.

domingo, 18 de outubro de 2015

Arwen

Gerada pelo DALL-E

Ela apareceu quando menos esperava. Na ocasião, os dias se alternavam como em ondas de esforços e lassidão. Torneavam os sonhos em coisas ensimesmadas, como se o impossível fosse a regra do desejo e tal desejo se enjaulasse dentro da pele. Ela surgiu no vazio das ambições cansadas de ilusões. Na herança de uma querença mesquinha, imposta por não sei o que. Talvez apenas por navegar pelos ventos soprados pelo egoísmo. Talvez apenas por viver uma vida em si, cheia de refugos dos outros ou de mim mesmo. Ela nasceu na minha morte, nas cinzas do meu desejo e no óbito do meu querer.

sábado, 29 de agosto de 2015

Fatos

Justine Dieuhl - Toulouse-Lautrec - Museu D'Orsay - Paris (foto do autor - 2008)

Eu quero me lembrar do teu rosto,
Já tão apagado pela espera destes anos.
Eras uma menina dentro de um corpo de mulher,
É o que me recordo.
Caminhavas com passos delicados,
E pisoteavas matreira a minha sombra.
Abrias um sorriso travesso,
Tão indócil que suas formas
São as que mais firmes estão no meu pensamento.

Eu quero despi-la de qualquer desgosto,
Que porventura fosse criado pela minha conduta.
A mágoa dos fatos mancha o eterno.
E o futuro se bifurca na indolência
É o que está na minha memória:
Um rosto e um sorriso
Enevoados pelo tempo e pelo remorso.
Uma mulher que perdeu a menina,
E passos que a levaram.

Quero fugir do que me foi imposto,
Já tão estampado quanto uma tatuagem.
Eras uma mulher dentro de uma menina.
É o que ficou nas minhas alucinações.
Corrias com passos acelerados,
Para escapar das minhas sobras.
Fechavas aquele sorriso moleque,
E emprestavas formas tristes ao rosto
Que lacrimejava teu abatimento.

Eu quero vesti-la com o meu gosto,
Que a presentearia após esta minha luta.
A certeza dos fatos a aqueceria no inverno
E o futuro convergiria na tua clemência.
Tu sairias da minha memória:
Um corpo e uma mulher,
Resgatados do tempo e do arrependimento.
Uma pessoa que ganhou a menina,
E passos que a trouxeram.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Olhos


Olhos! Também tenho olhos. Registro que tenho dois em bom estado de funcionamento, que veem o mundo sobre vários prismas, alguns até além da tão desejada simplicidade. Em alguns momentos, ser simples me dá tédio, em outros eu gosto. Havia (ou há) uma música do Raul Seixas que aclamava: “eu prefiro ser esta metamorfose ambulante do que ter aquelas velhas opiniões formadas sobre tudo”. Alma irrequieta? Decerto. Sonhador? Talvez... não. Não sonho mais, não durmo mais. E antes que se pense em aspectos vampirescos, eu digo que estou apenas desperto, observando, vendo pessoas passarem com suas vaidades na passarela. Corpos objetos de uma sociedade que abriga e rechaça. Vejo-as e não as desejo. Porém, algumas vezes, uma delas sai da linha e apresenta um comportamento inusitado. A máscara cai e ela se revela. São estes momentos que eu espreito. São aquelas ocasiões que displicente ou involuntariamente o ser desmura todo um mecanismo de obliteração do coração. É claro que eu poderia furar qualquer muro com a retórica da paixão. Ei! É uma analogia boa: eu criaria um buraco com as artimanhas do meu coração, mas o muro ainda estaria lá. Não conseguiria ver tudo, nem ao menos a dimensão do que tem do outro lado. Ao passo que se uma pessoa me atira o tijolo do seu muro, eu sei que ela quer ajuda para derrubá-lo. Então eu a olho, com uma mirada terna. Digo com a minha visão que sou da paz. Quero tudo derrubar, mas com consentimento.

Jaz no meu passado a angústia do tempo. Aquilo que tudo impulsiona, que tudo motiva pela insanidade da urgência. Desta forma, posso ser livre, como somente uma alma desperta pode ser. Já não mais sonho, pois estou acordado para o destino. Ele não mais me carrega, apenas me empurra.

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

A Trilha

By böhringer friedrich (Own work) [CC BY-SA 2.5 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/2.5)], via Wikimedia Commons

A trilha leva os meus passos e há algo de indolente que se esvai pelo caminho. Diria que é o meu corpo, rechaçado do convívio por um absoluto e imenso cansaço. Diria que é o meu ânimo, alquebrado pelas frustrações eternas, por aquela mulher que varreu todos os vestígios de felicidade. Um passo após o outro e a terra não me consome, mas as lembranças que vertem pelas lágrimas assolam a paisagem. Ela está lá estática e muda. Uma imagem de um rosto claro, com seus olhos cor de mel, a disputar matizes com o pôr do sol no infindo horizonte do destino. Inalcançável pelas lamúrias, pelas súplicas de paixão que um dia foram ignoradas. Um passo após o outro. Não me importa mais para onde ir ou onde chegarei. Qualquer lugar é qualquer lugar. Não haverá remanso e não haverá paz que afaste esta tormenta de não mais vê-la, a não ser pelas miragens que zombam pelo cotidiano.

Há algo de eterno no meu passado. Os passos caminham por si só, como se ignorassem a minha vontade de me perder. Não há mais um futuro para se sonhar, não há mais um objetivo por que lutar. Apenas um caminho do qual não se pode desviar. O abrigo para esquecer do mundo, é o próprio caminhar.

segunda-feira, 18 de maio de 2015

A Carta de Moriarty



“For a long while now I’ve suspected that connection with another person, real connection, simply isn’t possible. I’m curious if you disagree, although I suspect you feel as I do in this, as you do in so many other things. So tell me; is it possible to truly know another person? Is it even a worthwhile pursuit?

Yours is the only opinion I’ll trust, the only point of view that holds even the faintest interest. I find my diversions, as I always do, but the days are long in this grey place.

I dearly hope you’ll write soon.

Ever yours, Jamie Moriarty”

Em toda a minha história, não há elementos que me permitam dizer que uma conexão real com alguém é possível, pelo menos não de forma perene. Há momentos que estamos profundamente ligados, feitos magnetos que quanto mais próximos, mais a atração nos compele para os braços e para os desejos insanos de usurpar a vida do outro como a nossa própria. Talvez a chave para compreendermos a conexão esteja exatamente neste quesito: o tempo. Não estou falando do eterno ou do etéreo, não estou aqui para prognosticar que a felicidade depende de um vínculo que nem ao menos conseguimos compreender. Mas pense: quando os anos avançam, o que sobra na lembrança? Talvez uma imagem dos tempos infantis e juvenis, mas eu me envergonho das experiências daqueles anos que se foram. Nem aquelas músicas que balançavam nossos corpos têm mais graça. Sinceramente eu me lembro do rosto do meu filho, recém-nascido e surpreendido no elevador a caminho do quarto.  Porém eu acredito que o espanto talvez tenha dado uma dimensão maior para aquele instante, estampando-o como tatuagem na minha memória. O que definitivamente eu me recordo era a imagem de te ver pintando no ateliê. O chão sujo pelas cores derramadas, imagens mal começadas em algumas telas, e o teu rosto lentamente virando para o meu lado. Era um quadro dentro de outro que você pintava. Inicialmente a pele macia das tuas bochechas. Logo o vermelho suave dos lábios começa a aparecer, os cílios, a mão que segurava o pincel e permanecia estática a poucos centímetros da tela. Por fim, seus olhos brilhantes me perceberam, e um sorriso se iniciou no rosto. Um sorriso que nenhuma palavra pode conter.

Quanto tempo durou? Um, dois ou três segundos? Ou todos os anos desde que te vi naquele momento, naquele lugar? Aquela conexão ainda me persegue. Mesmo quando estou só ou acompanhado de outros braços.

(https://www.youtube.com/watch?v=uztaIJBUrcc)

São Jorge - Saint George

  Imagem gerada pelo Midjourney São Jorge! Mostraste a coragem misericordiosa que me livrou do dragão que sempre carreguei em meu coração. I...